Onde a morte habita? a cidade sob o signo da tanatologia

Onde a morte habita? a cidade  sob o signo da tanatologia.

Na nota introdutória de sua obra Os vivos e os mortos na sociedade medieval, publicada na última década do século passado, Jean-Claude Schmitt apresenta uma questão de significativa relevância para pensar o destino do homem após a sua morte. Evidencia ele a importância do imaginário da morte e destaca o papel desse ideário, considerando como ele se tornou um aspecto universalmente primordial nas estruturas societárias passadas e que ainda se mantém na atualidade. Ao argumentar sobre a tensão provocada pelo desaparecimento da vida e o terror do desconhecido, imposto aos vivos quando a morte se manifesta, Schmitt afirma que os mortos têm apenas a existência que os vivos imaginam para eles (SCHMITT, 1994, p.13), logo, os vivos estão pré-dispostos a criar e recriar simulacros de uma vida pos-mortem para seus defuntos e assim, pensar em um viver no além paralelo à sua cultura, suas crenças, sua época.

As narrativas apresentadas por Schmitt com frequência, atribuem aos mortos uma vida no além com a descrição de suas moradas e tudo aquilo que os vivos esperam para si próprios. Em outro plano, os discursos do autor são atravessados por questões amparadas na esfera religiosa, interpretadas à luz de visões metafísicas que na prática se valem de inúmeros elementos que habitam o cotidiano do mundo de vivos e nunca, por óbvio, o desconhecido território dos mortos. Nas visões em parte oníricas ou geradas pelo delírio que a dor da morte e da separação são capazes de impelir ao sujeito enlutado, as tradições, dogmas, mitos, medos e assombros se fazem presentes quando os domínios da morte se surge e se estabelecem na vida cotidiana.

Norbert Elias, em suas reflexões sobre a velhice na obra A solidão dos moribundos (1982), considera o peso da passagem do tempo no corpo e reflete sobre os limites da mente para suportar as dores que o morrer decreta aos seres humanos. Elias alerta o que parece óbvio, mas nem sempre, no curso da vida, revela-se como um fato a ser atestado por todos. Ao afirmar que na verdade não é a morte, mas o conhecimento da morte que cria problemas para os seres humanos (ELIAS, 2001, p. 11), Elias constrói para o leitor uma frase simples, mas com um vigor que revela a complexa trama de sentidos que surgem a partir do ato de morrer e mais, das etapas, demasiadamente enigmáticas, que se manifestam pós-morte naqueles que sepultaram seu semelhante e o que vira para o morto além-vida. Elias conclui que nada ainda consegue anular a partícula essencial que define a morte: a certeza da extinção do eu e a subtração do convívio com os vivos.

Ao entrecruzarmos as ideias sobre a mortalidade, o morrer, o falecimento, a ausência, a extinção, o luto e os estados de morte, que as obras e seus respectivos autores apresentam, surgem possibilidades instigantes para entendermos a potência desses fatos e a extensão dessas ações no cotidiano da cidade, especialmente se levarmos em consideração a sua representatividade real ou mesmo fugidia na paisagem e na formação do tecido social que diariamente se depara com o espectro da morte e  com os signos da tanatologia. As ideias trazidas também nos ajudam a interpelar as dimensões que envolvem a finitude da vida ou mesmo o desaparecimento de matéria não-humana que desenha nossas paisagens e que trazem em si memórias de tempos passados, histórias de pessoas e acontecimentos que passaram.

O encontro considerará igualmente as culturas material e imaterial que pode ser identificada no tecido urbano e no ciberespaço a partir das ideias de morte, luto, sofrimento, medo, dor, traduzidas por questões relativas à arquitetura cemiterial, aos artefatos que dão conta da historicidade e da espacialidade da cidade, da arte fúnebre tradicional e contemporânea, assim como dos novos  modos interpretativos  que as novas mídias, nas suas mais diferentes plataformas, sugerem para se tratar a morte e o morrer na contemporaneidade. O evento resulta de uma parceria entre os projetos de pesquisa Cemitérios: lugares de dor, luto e memórias paisagísticas do Grupo de Pesquisas Paisagens Híbridas Escola de Belas Artes/UFRJ  e Estudos de Arquitetura Cemiterial da Escola de Arquitetura  e Urbanismo  da Universidade Federal Fluminense | EAU/UFF.

Detalhes do evento:

Dia(s): 13 nov 2018
Horário: 10h00 - 13h30

Local: Faculdade de Letras da UFRJ, Auditório E-2
Av. Horácio Macedo, 2151, Cidade Universitária, Ilha do Fundão. , Rio de Janeiro, RJ

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Inscrição:

A confirmação da inscrição é de responsabilidade do organizador do evento.

Valor: Gratuito
Período de inscrição: 30/10/2018
Site: https://paisagenshibridas.eba.ufrj.br/2018/10/26/onde-a-morte-habita/
Instituição responsável: Escola de Belas Artes - EBA/UFRJ
Email do organizador: paisagemcemiterial@gmail.com
Telefone de contato: (21) 98465-9547